Lubango 2008
Sonho de Ficar….
Quando cheguei levava um sonho.
Ficar....
Na escola 14 de Abril e ficar na memória dos pequenos com quem brincava, a quem dei amor, e a quem ensinei. Dos adolescentes que esclareci e com quem partilhei momentos simples e únicos.
Nos doentes com mão dada, no colo, no cobertor, no curativo, dando apoio, coragem e sorrisos. Não daqueles momentâneos, curtos e vagos mas sorrisos que ficam para a Vida. Sorrisos de Esperança.
No coração do Bruno que me chamou de Mãe e pelo qual rezo todos os dias, não só por ele, mas por todos.
Nas amizades que fiz.
Nos olhares cúmplices que troquei.
Na memória daqueles homens e mulheres com quem nos íamos cruzando nas ruas.
Nas pedras da calçada presentes em todos caminhos que palmilhei.
Quis deixar uma semente de trigo, de amor, e de bem por onde passei e espero que nasça e que seja colhida por alguém num presente ou num futuro.
Ficarão todos comigo, no fundo do meu ser.
Um Ficar que deixou Saudade
Tenho saudades do mato e das planícies sem fim, da voz gasta quando cantei para todos eles que chegavam de todos os lados quando eu já lhes tinha perdido a conta.
Tenho saudade da terra do Tchioco, de jogar futebol com eles, de lhes contar histórias, de distribuir a comida, e de passear pelas suas camaratas. De sacudir os seus cobertores, de lavar roupa. Da criatividade de trabalhar no barro e dos seus carrinhos de lata.
Tenho saudades de me sentar na cadeira azul à sombra da árvore onde tudo acontecia…
Tenho saudades de lavar panelas no Nazaré, de passear pela horta, de cavar a terra, de dar explicações, de conversar com o Zito sobre economia e política e do sotaque espanhol do padre Luís.
Tenho saudades do Sabalito, do Kapiqueno, do Zacarias, do KJ, do Tcholeca, do Zezito, do Júlio, do Tomás, do Sebastião, do Kamondongo, da Alice, da Cipri, da Isabel, da Carol… de todos os Pequenos.
Tenho saudades do caminho do hospital, da entrada da ortopedia, de dizer cheguei, de falar e sorrir com eles, de sentar-me nas suas camas, de brincar com aqueles pequenos traquinas que se escondiam para que fosse a correr procurá-los…. E tenho saudades de encher os balões para brincar.
Tenho saudades do perfume das meninas, das suas vozes, brincadeiras, cantorias e carinhos.
Tenho saudades do banho de água fria e de ver as estrelas no campo do complexo até de madrugada.
Tenho saudades de adormecer no beliche a ver essas mesmas estrelas.
Tenho saudades de rir e de chorar. Tenho saudades de contar as curvas da Leba, da areia do Namibe, de gritar do cimo do Cristo Rei para todos e dizer “estou com vocês” de tocar o manto branco da Senhora do Monte.
Tenho saudades do nosso Maboque que fazia alongar a noite.
Tenho saudades de não subir o imbondeiro e dizer ao vento que leve o eco da minha voz a cada um dizendo que os AMO.
Tenho saudades de ter o Sol tranquilo e cor-de-laranja a despertar o meu dia tocando-me com os seus raios gentis como que dizendo: “Acorda, Levanta-te, Já preparei para ti mais um dia para o outro.”, e despedindo-se de uma maneira tão única que só Lá vi, como que dizendo à Lua: “ Agora é a tua vez, faz tão bem quanto eu”.
Tenho saudades de não ter vivido mais tudo aquilo que vivi,
Dedico somente a vocês as duas, minhas avós, que pelos valores que me deram, me fizeram de alguma maneira ir e hoje são as estrelas mais brilhantes do Céu de quem terei eterna saudade.
Fico com a certeza que a felicidade não está na luta na vingança mas sim na união dos corações e das vontades.
É no dar que recebemos e é nesse dar e nessa entrega que tudo muda e sentimos que encontramos a verdadeira felicidade, quando vivemos para o outro sem nome de Lugar e sem nome de Pessoa.
Fico com a certeza de que ensinar será um dar para sempre!
CLÁUDIA CALHEIROS |
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